Governança de dados não é mais diferencial. É requisito de legitimidade.

Nos últimos anos, a Meta (antigo Facebook) acumulou multas que ultrapassam 6 bilhões de euros por violações graves à privacidade e à proteção de dados. Em 2019, a empresa foi penalizada em 5 bilhões de dólares pela Federal Trade Commission (FTC) dos Estados Unidos após o escândalo da Cambridge Analytica — uma consultoria que obteve acesso indevido aos dados de aproximadamente 87 milhões de usuários, explorando permissões mal estruturadas entre aplicativos da plataforma. Esses dados foram utilizados para fins de manipulação eleitoral nos Estados Unidos e no Reino Unido, revelando não apenas um vazamento massivo, mas uma arquitetura permissiva e sem controles claros sobre o ciclo de vida dos dados.
Mais recentemente, em 2023, a Meta foi novamente sancionada — desta vez pela Comissão de Proteção de Dados da Irlanda (órgão responsável pela aplicação do Regulamento Geral de Proteção de Dados da União Europeia) — no valor de 1,2 bilhão de euros. A empresa continuava a transferir dados de usuários europeus para servidores nos Estados Unidos, mesmo após o Tribunal de Justiça da União Europeia invalidar os acordos internacionais de proteção de dados entre os blocos (como o Privacy Shield, em 2020).
Dois casos distintos, mas com uma falha estrutural em comum: a ausência de governança eficaz sobre dados sensíveis. A falha não reside apenas na violação pontual da privacidade, mas na inexistência de uma estrutura de controle, transparência, rastreabilidade e auditoria, elementos centrais à conformidade em ambientes regulados.
De acordo com o relatório “Cost of a Data Breach Report 2023” da IBM Security, o custo médio global de uma violação de dados atingiu 4,45 milhões de dólares — um aumento de 15% em três anos. Ainda segundo o estudo, as organizações com maior maturidade em governança de dados, especialmente aquelas que adotam frameworks como Zero Trust e modelos de inteligência artificial para detecção precoce de riscos, reduzem esse custo em até 1,76 milhão de dólares.
No Brasil, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) segue a mesma linha de rigor normativo. Entrou em vigor em 2020 e, desde então, já há decisões da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) aplicando sanções por descumprimento. O caso da operadora de telecomunicações Telekall, multada em 14 mil reais por infrações à LGPD, é um exemplo concreto do avanço da fiscalização — mesmo em organizações de menor porte.
É importante reforçar: não é a escala que define o risco, mas o grau de controle. Empresas que lidam com dados sensíveis — como comportamento político, monitoramento institucional ou regulação pública — operam em uma zona de exposição crítica. A informalidade, nesses setores, não é apenas um risco reputacional: é uma ameaça à legitimidade das operações.
A governança de dados, portanto, não deve ser vista como um requisito técnico ou um esforço de compliance reativo. Ela é a base para a construção de confiança, legitimidade institucional e sustentabilidade regulatória.